CURSO DE EXTENSÃO DOS POLOS UAB
PÓLO EDUCACONAL SUPERIOR DE RESTINGA SÊCA
Ana Paula Marin
Ana Lúcia Lima
Andressa Tatiele Pohlmann
Celer Teresinha dos Passos Pohlmann
Cláucia Pessoa de Abreu
Uma estirada até a cidade grande.
Era uma vez um guri que vivia a camperear pelos prados de Restinga Sêca. Adorava troperear com seu cavalo guapo por estes pagos. Mas, o guri com o passar do tempo virou um baita gaudério. Deixou a lida do campo e foi embora da querência em troca dos ditos prazeres que haviam na cidade grande, mal sabia ele como se arrependeria...
Quando o ônibus chegou à cidade tinha um mundaréu de carros de lá para cá, daqui para lá. Umas luzinhas coloridas para fazê-los parar – a tal de sinaleira. E gente, muita gente de tudo quanto é jeito e tipo. Era um entrevero só. O gaudério ficou tonto que nem cavalo bagual que quando se assusta fica sem rumo.
Então, resolveu ir tomar uma caneca de café com leite bem quente para acalmar os ânimos. Sentou num bolicho e pediu um café. O garçom então falou: O senhor deseja um pingado, um expresso, um capuccino? Qual o tipo de café? O gaudério que nunca tinha ouvido falar daquilo tudo, já meio esquentado, pensou: café pingado? Mas pingado com o quê? Será que tem um buraco na caneca? Expresso – que bicho de palavra é essa? Capuccino, então, parece palavra do estrangeiro?
Desistindo do café, o gaúcho deixou-se divagar...
Anos antes a querência era outra: as tropeadas eram feitas sem medo de saqueadores, e se um bezerro se perdia, era cravar a chilena no zaino, pois logo adiante pararia no aguado... Tempos diferentes, já que convidar uma prenda para viver acolherado não era ofensa, um gaúcho afamiliado respeitava os seus, agüentava o repuxo, mas tudo valia a pena quando boleava a perna na frente do rancho, e sua prenda, com um doce sorriso, trazia o amargo ( feito com água da cacimba que tem um gosto melhor) e um baio, já aceso....
Então, de lampejo, bateu a saudade!
- Companheiro! – disse ao garçom – Entonce isso não é lida pra mim, antes que me estique as canelas, vou atrás de tudo que deixei – e de supetão foi-se.
Era triste uma barbaridade! Um ginete sem montaria, retornando ao pago, com saudade da prenda e de seu cusco, fiel companheiro de muitas andanças.
GLOSSÁRIO:
BAGUAL – potro recém-domado, arisco, espantadiço. Pessoa grosseira.
BOLICHO - Casa de negócios de pequeno sortimento e de pouca importância. Bodega
CAMPEREAR- Trabalhar com o gado, no campo.
CHILENA- esporas com rosetas muito grandes.
RANCHO- casebe de pau-a-pique, com porta, onde moram peões ou gente pobre.
AMARGO- mate chimarrão, mate sem açucar. É a bebida usada em todo o estado do Rio Grande do Sul.
CACIMBA- fonte de água potável. Vertente.
BAIO- cigarro crioulo, feito com fumo em rama e palha de milho.
ESTIQUE AS CANELAS- morra
GINETE-pessoa que monta bem, com firmeza e com garbo.
PAGO- lugar em que se nasceu, lar.
CUSCO- cão pequeno, de raça ordinária
ENTREVERO - Mistura, desordem, confusão de pessoas, animais ou objetos.
GAUDÉRIO - Pessoa que não tem ocupação séria e vive à custa dos outros, andando de casa em casa. Amigo de viver à custa alheia.
GUAPO – Forte, vigoroso, valente, bravo.
GURI – Criança, menino, piazinho, garoto, serviçal para trabalhos leves nas estâncias.
PAGO – sinônimos: Rincão, Querência, Lar. Lugar onde se nasceu.
PRADOS – Campo coberto de plantas forraginosas.
QUERÊNCIA - Lugar onde alguém nasceu, se criou ou se acostumou a viver, e ao qual procura voltar quando dele afastado. Lugar onde habitualmente o gado pasta ou onde foi criado.
TROPEREAR- Trabalhar como condutor de tropas, de gado, de éguas, de mulas, ou de cargueiros – tropeiro.
AFAMILIADO- que tem familia
AGUENTAVA O REPUXO- enfrentar situação difícil.
TROPEADAS- Caminhada com a tropa.
CAFÉ EXPRESSO - Café fortemente concentrado, obtido de máquina, servido em pequena xícara.
CAFÉ PINGADO - Café com leite escuro; leva pouco leite.
CAPUCCINO - Reúne ao café expresso o leite, pouco chocolate em pó, canela e cobertura de chantilly e açúcar.
ZAINO- animal cavalar
AGUADO- lugar utilizado pelos animais para beberem água. Bebedouro.
ACOLHERADO- andar uma pessoa acolherada a outra, significa andar uma pessoa sempre junta de outra.
Fontes de pesquisa do glossário:
http://www.cobra.pages.nom.br/bmp-cafe.html
http://www.patriapampa.com/dicionario-cesarrogeires/
http://www.dicionarioinformal.com.br/buscar.php?
http://dicionario.babylon.com/troperear/#
http://www.portalgaucho.com.br/?pg=14
http://books.google.com/books?
http://www.corujando.com.br/arquivo/gauchos jabor.htm
- Dicionário de Regionalismo do Rio Grande do Sul, de Zeno e Rui Cardoso Nunes.
Considerações:
Esta breve história imaginada por nós, colegas no curso de Mediadores, fez-nos refletir sobre nossa cultura, transmitida de geração em geração. Somente sendo gaúcho para entender o tamanho de nosso amor pelo pago.
Nosso ilustre Arnaldo Jabour, nos brinda com a crônica “Os Gaúchos", disponível em: http://www.corujando.com.br/arquivo/gauchos_jabor.htm
por Arnaldo Jabor
O Rio Grande do Sul é como aquele filho que sai muito diferente do resto da família. A gente gosta, mas estranha. O Rio Grande do Sul entrou tarde no mapa do Brasil . Até o começo do século XIX, espanhóis e portugueses ainda se esfolavam para saber quem era o dono da terra gaúcha. Talvez por ter chegado depois, o Estado ficou com um jeito diferente de ser.
Começa que diverge no clima: um Brasil onde faz frio e venta, com pinheiros em vez de coqueiros, é tão fora do padrão quanto um Canadá que fosse à praia. Depois, tem a mania de tocar sanfona, que lá no RS chamam de gaita, e de tomar mate em vez de café. Mas o mais original de tudo é a personalidade forte do gaúcho. A gente rigorosa do sul não sabe nada do riso fácil e da fala mansa dos brasileiros do litoral, como cariocas e baianos. Em lugar do calorzinho da praia, o gaúcho tem o vazio e o silêncio do pampa, que precisou ser conquistado à unha dos espanhóis.
Há quem interprete que foi o desamparo diante desses abismos horizontais de espaço que gerou, como reação, o famoso temperamento belicoso dos sulinos.
É uma teoria - mas conta com o precioso aval de um certo Analista de Bagé, personagem de Luis Fernando Veríssimo que recebia seus pacientes de bombacha e esporas, berrando: "Mas que frescura é essa de neurose, tchê?"
Todo gaúcho ama sua terra acima de tudo e está sempre a postos para defendê- la. Mesmo que tenha de pagar o preço em sangue e luta.
Gaúcho que se preze já nasce montado no bagual (cavalo bravo). E, antes de trocar os dentes de leite, já é especialista em dar tiros de laço. Ou seja, saber laçar novilhos à moda gaúcha, que é diferente da jeito americano, porque laço é de couro trançado em vez de corda, e o tamanho da laçada, ou armada, é bem maior, com oito metros de diâmetro, em vez de dois ou três.
Mas por baixo do poncho bate um coração capaz de se emocionar até as lágrimas em uma reunião de um Centro de Tradições Gaúchas, o CTG, criados para preservar os usos e costumes locais.
Neles, os durões se derretem: cantam, dançam e até declamam versinhos em honra da garrucha, da erva-mate e outros gauchismos. Um dos poemas prediletos é "Chimarrão", do tradicionalista Glauco Saraiva, que tem estrofes como: "E a cuia, seio moreno/que passa de mão em mão/traduz no meu chimarrão/a velha hospitalidade da gente do meu rincão." (bem, tirando o machismo do seio moreno, passando de mão em mão, até que é bonito).
Esse regionalismo exacerbado costuma criar problemas de imagem para os gaúchos, sempre acusados de se sentir superiores ao resto do País.
Não é verdade - mas poderia ser, a julgar por alguns dados e estatísticas.
O Rio Grande do Sul é possuidor do melhor índice de desenvolvimento humano do Brasil, de acordo com a ONU, do menor índice de analfabetismo do País, segundo o IBGE e o da população mais longeva da América Latina, (tendo Veranópolis a terceira cidade do mundo em longevidade), segundo a Organização Mundial da Saúde. E ainda tem as mulheres mais bonitas do País, segundo a Agência Ford Models. (eu já sabia!!!rss) Além do gaúcho, chamado de machista", qual outro povo que valoriza a mulher a ponto de chamá-la de prenda (que quer dizer algo de muito valor)?
Macanudo, tchê. Ou, como se diz em outra praças: "legal às pampas", uma expressão que, por sinal, veio de lá.
Aos meus amigos gaúchos e não gaúchos, um forte abraço!